ai ai...
Um esconderijo. A mesma alma. A mesma escrita. Outro local onde a ficção e a realidade se hão-de sempre misturar!
12/12/2007
11/12/2007
Natal à Beira-Rio
NATAL À BEIRA-RIO
É o braço do abeto a bater na vidraça?
E o ponteiro pequeno a caminho da meta!
Cala-te, vento velho! É o Natal que passa,
A trazer-me da água a infância ressurrecta.
Da casa onde nasci via-se perto o rio.
Tão novos os meus Pais, tão novos no passado!
E o Menino nascia a bordo de um navio
Que ficava, no cais, à noite iluminado...
Ó noite de Natal, que travo a maresia!
Depois fui não sei quem que se perdeu na terra.
E quanto mais na terra a terra me envolvia
E quanto mais na terra fazia o norte de quem erra.
Vem tu, Poesia, vem, agora conduzir-me
À beira desse cais onde Jesus nascia...
Serei dos que afinal, errando em terra firme,
Precisam de Jesus, de Mar, ou de Poesia?
Lisboa, Editorial Presença, 1988
09/12/2007
Maria-dos-olhos-grande e Zé Pimpão
tinha uns olhos grandes grandes
que pareciam azeitonas
Maria-dos-olhos-grandes
tinha uns olhos de ver o mundo
Maria tinha umas tranças
pequeninas
bem espetadas
pareciam duas antenas
Maria tinha umas tranças
bem espetadas de ouvir o mundo
Maria tinha um vestido
que era de todas as cores
mas uma de cada vez
Maria tinha um vestido
com todas as cores do mundo
Maria tinha um amigo
muito giro muito vivo
moço da rua e da gente
era um amigo a valer
Maria tinha um amigo
chamava-se Zé Pimpão
Zé Pimpão era um miúdo
de olhos piscos guedelhudo
Zé Pimpão sabia o mundo
Zé Pimpão tinha nos olhos
as viagens que sonhou.
Zé Pimpão tinha nos olhos
a côr do sol e do mar
Zé Pimpão tinha nos pés
uns pés grandes e descalços
Zé Pimpão com os pés nús
sentia melhor a rua
Numa manhã quente quente
com o sol bem descarado
com um sol de passear
assobiou Zé Pimpão
para apressar a Maria
Maria veio, deu-lhe a mão
foram-se os dois a cantar
Zé Pimpão levou Maria
a ver o mundo muito longe
Zé Pimpão levou Maria
a ver os dois lados do mundo
Maria-dos-olhos-grandes
não podia acreditar
que o mundo era assim
Maria-dos-olhos-grandes
julgava que o mundo mundo
era só o seu jardim
Zé Pimpão estva contente
Mas não sabia Maria que depois
do seu jardim...
Mas não sabia Maria
que o mundo era muita gente?
Maria-dos-olhos-grandes
pensava que o mundo a sério
era a tia Joaquina
era o tio Salustrião
era o pai e era a mãe
mais o primo pequenino
e é claro o Zé Pimpão
Maria-dos-olhos-grandes
Via o mundo pequenino
E Zé Pimpão mais sizudo
mostrou então à Maria
que num dos lados do mundo
havia prédios bem altos
e mais jardins floridos
muita luz e muitas cores
Zé Pimpão levou Maria
do lado de cá do mundo
Foram foram saltitando
sobre as pedrinhas na lama
vendo cortinas-jornais
telhados de papelão
e miúdos reinadios
amigos do Zé Pimpão
que nunca olharam o céu
pois vêem o sol nos charcos
pois vêm o sol no chão
Com uns olhos tristes tristes
Zé Pimpão levou Maria
do lado de lá do mundo
do lado que não se vê
onde há barracas escuras
Feitas nem sabe de quê
e miúdos a chorar
e onde os brinquedos são pedras
e a lama são os jardins
Zé Pimpão levou Maria
do lado de lá do mundo
Maria viu e reviu
um mundo novo tão velho
que precisa de aprender
que precisa que os meninos
o ensinem a crescer
Para fazer um mundo novo
um mundo velho tão novo
Quando voltaram à noite
Maria-dos-olhos-grandes
com uns olhos de ver mundo
trazia o mundo nos olhos
para dizer ao Zé Pimpão:
Zé Pimpão vamos fazer
que haja um só lado do mundo
Ou só o lado de cá
ou só o lado de lá
Zé pimpão eu queria o mundo
com todos do mesmo lado
Se não há jardins para todos
vou dividir os canteiros
se os canteiros não chegarem
uma flor para cada um
e se as flores forem poucas
há pétalas
enfim há cheiro
mas todos terão igual.
05/12/2007
Carlos Drummond de Andrade
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.
Nunca me esquecerei desse acontecimento
na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra.
-
Por muito tempo achei que a ausência é falta.
E lastimava, ignorante, a falta.
Hoje não a lastimo.
Não há falta na ausência.
A ausência é um estar em mim.
E sinto-a, branca, tão pegada, aconchegada nos meus braços,
que rio e danço e invento exclamações alegres,
porque a ausência, essa ausência assimilada,
ninguém a rouba mais de mim.
01/12/2007
Before Sunrise
28/11/2007
Um amor atrevido
21/11/2007
The woman in blue
Hoje vesti-me de azul. Azul até podia ser a minha cor favorita, mas hoje... hoje serve para mostrar ao mundo como me sinto.
O meu coração vestiu-se também de azul. Há dois dias que o sangue que corre nas minhas veias está azul.
Para os outros vestir-me de azul não tem nada de especial, nada de anormal. Aliás, azul podia ser a minha cor favorita, mas hoje... hoje serve para mostrar ao mundo como me sinto.
16/11/2007
a partir de uma sms para um menino...
Apetece-me ver como a espuma desaparece quando a água se recolhe.
Apetece-me ser embalada pela estranha melodia que acompanha este movimento ritmado...
Um novo ciclo começa a cada 7 ondas. Será que nós também temos ciclos de 7 ondas?
Será que o nosso ser anda num movimento ritmado pelas ondas, que a cada 7 nos traz a felicidade? Será que nós deixamos a onda da felicidade nos tocar e a espuma nos beijar?
09/11/2007
Este senhor...
06/11/2007
Henry Scott Holland
Death is nothing at all
Death is nothing at all.
I have only slipped away into the next room.
I am I and you are you.
Whatever we were to each other,
that we still are.
Call me by my old familiar name.
Speak to me in the easy way
which you always used.
Put no difference in your tone.
Wear no forced air of solemnity or sorrow.
Laugh as we always laughed
at the little jokes we enjoyed together.
Play, smile, think of me, pray for me.
Let my name be ever the household word
that it always was.
Let it be spoken without affect,
without the trace of a shadow on it.
Life means all that it ever meant.
It is the same that it ever was.
There is absolutely unbroken continuity.
Why should I be out of mind
because I am out of sight?
I am waiting for you,
for an interval,
somewhere very near,
just around the corner.
All is well.
Só agora publico um poema que há muito conheço. Talvez por não me lembrar dele tão frequentemente só o publico agora depois de ter sido tema de conversa no fim-de-semana passado.
Sim, a morte não é nada de especial. Concordo com tudo o que aí está.