14/07/2008

Paraíso

Hoje cheguei ao meu paraíso. Cheguei ao meu porto de abrigo, a minha eterna zona de segurança, ao meu paraíso…

O ritual mantém-se: chego, abro janelas, deixo a luz entrar na casa fechada e saio com um único destino em mente – sentir a areia nos meus pés, arrepiar-me com as cócegas que ainda hoje me fazem, sorrir ao sentir que finalmente cheguei. Dou mais uns passos até que deixo molhar o que trago vestido, sinto as ondas baterem-me, sinto-me acariciada pela água salgada que há muito não sentia na minha pele. Dou uns passos para trás e sento-me a contemplar. Nunca me canso de olhar para o mar, como se fosse a primeira vez que o avisto. Sinto-me bem. Sinto-me acompanhada. Mesmo estando só, sei que não estou. Sei que ali, naquele momento, nunca estarei só.

Há alturas em que sei que preciso de aqui estar. Em que preciso quase de me equilibrar novamente. Sei que só aqui consigo acertar novamente o passo que desacertei sem saber bem como. Sei que só aqui sou eu e me sinto completa. Como se um local fosse capaz de trazer paz e companhia que preciso. Não sei como, mas aqui sei que tenho paz, sei que estou acompanhada. Não sei como este local o consegue, mas conheço bem os seus efeitos.

O ritual mantém-se quer seja inverno ou verão. Quer seja na primavera ou outono. Quer seja de manhã ou como hoje, ao pôr-do-sol.

Houve um outro dia que cheguei nesta altura. Que cheguei quando já quase não havia sol. Quando o vento frio me fez arrepiar e a areia me aqueceu os pés. Nesse dia tomei uma decisão. Nesse momento tu soubeste-a. Quis-te comigo, mas sabias que eu precisava de estar aqui, sozinha, comigo apenas. Não vieste, mas a partir desse dia ficaste comigo.

Podia dizer que ficaste comigo até hoje, ou que ainda hoje continuas comigo, mas isso não é a verdade. A verdade é que tiveste comigo o tempo necessário para eu crescer. O tempo que eu precisei para ver como é bom ser seduzida. Tu, o sedutor, me seduziste. Rio só de pensar nessa noite, na noite em que te descreveste com uma só palavra: Sedutor! E eu ri nessa noite, sorri-te para te dizer que sim, concordava com isso, em pleno. E eu, como é que eu me descrevia… tarefa complicada para alguém como eu, alguém a quem eu achava que ninguém dava valor, que pensava que nada valia. Eu… completamente e cegamente seduzida por ti. Cegamente não. Sempre soube que duraria pouco tempo. Sempre soube que depois viriam as tormentas, sempre soube que não lutaria pela aceitação dos outros. Por isso o segredo. Sempre soube que era apenas isso. Um segredo de verão.

É engraçado olhar para trás agora e ver que já passaram quatro anos e uma pergunta apenas me ficou entalada. Nada mais que isso, apenas uma pergunta: qual a tua opinião de mim. Nem quero saber razões pelo teu afastamento, não quero razões para o teu silêncio, não quero saber isso. Não me interessa. Já passou. Mas também não quero saber de ti. Não quero pormenores da tua vida. Não quero saber o que te atormenta de noite enquanto dormes. Não quero saber por que acordas com respiração ofegante, ainda hoje. Não quero saber que sentes falta de estar no teu meio. Não quero saber que só no silêncio do mergulho te sentes bem. Não quero saber que te sentes feliz com as alegrias de quem tu queres bem. Não quero saber que te angustia ficar fechado no teu gabinete sem poderes aproveitar o sol e o calor no mar. Não quero saber… Não quero saber porque isso ainda o sei.

Quatro anos passaram e eu sei que continuas igual. Sei que continuas a querer mudar, a instigar os outros para a mudança, mas és tu que mais precisas dela e te resignas mais uma vez. És tu que achas pedras onde são apenas ornamentos no caminho. És tu que esperas pelo dia em que possas finalmente voltar ao sítio onde o sol brilha. És tu que esperas, mas és tu que nada fazes por isso.

A felicidade já a tiveste. Já a deixaste. Já a voltaste a ter e já a deixaste vezes suficientes para saberes o que podes ou não fazer. Comigo não foste feliz. Nem por um dia. Sei-o. Nunca mo precisaste de dizer. Eu fui feliz contigo. Muito. Mas isso foi muito bom para mim. Mesmo muito. Hoje sei que era nas linhas que lia que era feliz. Era nos sorrisos e risos que trocámos que sei que era feliz. Era nos abraços e quando me chamavas que sei que era feliz. Fui muito nesses dias quentes de verão. Mesmo muito. Hoje recordo esses dias como velhos tempos. Um tempo em que tudo era como sempre tinha desejado.

Gostava dos desafios que me colocavas. Gostava das interrogações com que comecei, até que depois não quis saber mais nada. Era como o poema que me mostraste um dia dizia: não interessa com o que vens. Era ali que queria estar e era assim que eu queria estar. O passado de nada interessava. Não fazia sentido. Nunca fez.

Já escrevi muito acerca de ti. Já pensei muito em ti. Já quis saber de ti. Agora não. Continuo a saber como estás. Conheço-te e sei como estás. Não preciso de mais.

No comments:

Post a Comment